Por Jorge Fonseca de Almeida - Membro da Ordem dos Economistas nº 1083
Imaginemos que um país podia emitir a quantidade de moeda que quisesse criando a maior inflação no seu país. Para compensar a inflação aumentava os rendimentos dos seus residentes. Com a moeda adicional comprava bens e serviços no estrangeiro. Podia comprar o que pretendesse já que se podia sempre imprimir cada vez mais moeda. Esta situação na vida real acaba, como Portugal bem sabe da sua experiência passada, numa desvalorização da moeda que reponha o equilíbrio internacional. Não há almoços grátis. Comprar com papel não serve o vendedor. É que os outros não estão para pagar pela inflação de nenhum país.
O será que certos países, menos capazes de gerir as suas contas, permitem que isso aconteça?
Na verdade é o que está a acontecer hoje. Por causa da moeda única, do euro. Porque a moeda única impede que a moeda dos países com menor inflação se valorize como seria economicamente positivo. Portugal é um dos três países com menor inflação na União Europeia. Os restantes continuam a aumentar a moeda em circulação. Ou seja os seus cidadãos e empresas têm agora mais euros para comprar coisas no estrangeiro. Naturalmente, fora da Europa não lhes deixam fazer isso e a taxa de câmbio corrige imediatamente qualquer diferencial de inflação.
Mas no interior da União, em que a moeda é comum, os que têm maior inflação ficam com mais euros para comprar nas zonas de menor inflação. Ou seja reforçam a sua riqueza à custa dos outros. E estes deixam? Portugal está a deixar. Sem moeda que se pudesse valorizar, Portugal fica desarmado perante países de elevadas taxas de inflação que podem comprar os nossos produtos e ativos a preços baixos com a maior facilidade. É o que vemos acontecer todos os dias.
O diferencial entre salários aumenta já que uns são atualizados à inflação mais baixa (Portugal) e outros proporcionalmente à inflação mais alta (quase todos os outros), e o poder de compra dos que têm inflação mais alta aumenta na medida em que podem comprar muitos bens a preços baixos nos países de menor inflação.
Para Portugal isso significa uma corrente migratória para fora do país, uma saída das pessoas qualificadas mas também de todas as outras. Significa também um aumento do volume do emprego, porque a procura externa aumenta artificialmente, porque paga em euros vindos de países de alta inflação (cuja moeda devia estar desvalorizada). O aumento da emigração e um volume de emprego elevado são situações em geral contraditórias só possível porque compensada pela imigração e pela aceitação do empobrecimento pelos trabalhadores.
Em contrapartida tudo o que é importado da zona euro (que é quase tudo) encarece. Para manter o equilíbrio externo só há uma solução: consumir menos. A baixa inflação, significa menor aumento dos rendimentos. Como o rendimento cresce menos do que os preços importados dos países com alta inflação só resta consumir menos. Consumir menos é outra forma de dizer empobrecer.
Temos assim a verdadeira realidade da baixa inflação. Uma transferência massiva de valor de Portugal para os países de alta inflação, um empobrecimento generalizado do país. Um desastre na verdade.
E é deste desastre que os políticos portugueses tanto se orgulham. Como é possível? Os outros imprimem dinheiro, ficam com ele, e
compram em Portugal. Nós aceitámos. Inacreditável. Na verdade é como se lhe fizéssemos um enorme desconto em tudo o que nos compram.
Só se orgulham tanto desta incrível política porque contam com a ignorância da população. Conseguem fazer passar por positivo a principal causa atual de empobrecimento do país.
Será que a Alemanha ou a França deixariam que isso algum dia lhes acontecesse? Certamente que não. Nós próprios sabemos como estes países nos trataram quando Portugal tinha uma inflação elevada.
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